A descoberta do Campo de Tupi em 2006, na Bacia de Santos, deu início a uma nova era para a Petrobras, transformando o Brasil em uma potência mundial do petróleo.
A descoberta do Campo de Tupi, em julho de 2006, é o marco que divide a história da indústria de petróleo brasileira. O anúncio de um reservatório gigante, com até 8 bilhões de barris de óleo, localizado sob uma intransponível camada de sal a quase 7.000 metros de profundidade, não apenas mudou o mapa energético do país, mas redefiniu o futuro econômico e geopolítico do Brasil.
O que antes era considerado o “fim do mundo” para a exploração de petróleo se tornou uma realidade produtiva. Operado pela Petrobras, o Campo de Tupi não apenas exigiu a superação de desafios tecnológicos sem precedentes, como também impulsionou a produção nacional a níveis recordes, colocando o país entre os maiores produtores e exportadores de petróleo do mundo.
A descoberta de 2006: a aposta calculada da Petrobras que encontrou um tesouro no Campo de Tupi
A existência de petróleo sob a camada de sal era uma teoria que intrigava os geólogos da Petrobras por anos. No entanto, a exploração era considerada de altíssimo risco, pois não existia tecnologia consolidada para perfurar em um ambiente tão extremo. A virada aconteceu a partir de 2003, quando a diretoria da estatal, com o apoio do governo federal, decidiu assumir o risco e investir em um ousado programa de perfuração para testar a tese de que a camada de sal, que por milhões de anos selou e cozinhou a matéria orgânica, guardava um tesouro energético.
O momento decisivo veio em julho de 2006, quando o poço pioneiro 1-BRSA-369-RJS, perfurado no bloco BM-S-11 da Bacia de Santos, confirmou a existência de uma imensa coluna de óleo de alta qualidade. A descoberta foi mantida em sigilo por mais de um ano, e o anúncio oficial, em novembro de 2007, abalou a indústria global. O Campo de Tupi era operado por um consórcio liderado pela Petrobras (65%), em parceria com a BG Group (25%), hoje parte da Shell, e a Galp Energia (10%).
A tecnologia dos FPSOs e a reinjeção de CO₂ para vencer os 7.000 metros de profundidade

Desenvolver o Campo de Tupi exigiu uma revolução tecnológica. O ambiente do pré-sal, com águas ultraprofundas, uma camada de sal de 2.000 metros de espessura e reservatórios sob alta pressão e temperatura, forçou a Petrobras a criar soluções inéditas.
A estratégia de produção se baseou no uso de Unidades Flutuantes de Produção, Armazenamento e Transferência (FPSOs). Entre 2010 e 2019, uma frota de nove desses navios-plataforma foi instalada no campo, em um projeto que utilizou um design “replicante” para acelerar a construção e reduzir custos.
A inovação mais importante foi a gestão do CO₂. Com o gás extraído sendo rico em dióxido de carbono, a Petrobras desenvolveu a técnica pioneira de CCUS (Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono). O CO₂ é separado a bordo do FPSO e reinjetado no reservatório, uma solução de duplo benefício: ambiental, ao evitar a emissão de milhões de toneladas de gases de efeito estufa; e econômico, ao usar o gás para manter a pressão do reservatório e aumentar a recuperação de petróleo.
A produção do Campo de Tupi que supera a de países inteiros
A produção no Campo de Tupi começou oficialmente em 1º de maio de 2009, com um Teste de Longa Duração. Desde então, a ascensão foi meteórica. Em julho de 2019, o campo já produzia quase 1 milhão de barris de petróleo por dia.
Mesmo em abril de 2024, após 15 anos de operação, Tupi mantinha uma produção média de 850 mil barris de óleo equivalente por dia, o que representa cerca de 20% de toda a produção brasileira. A escala é tão grande que, se o Campo de Tupi fosse um país, ele estaria entre os 20 maiores produtores de petróleo do mundo, com um volume superior ao de nações como a Colômbia.
De Tupi a Lula e de volta: a controvérsia política sobre o nome do campo

A imensa importância de Tupi para o Brasil tornou seu nome um campo de batalha simbólico e político. Em dezembro de 2010, no fim do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Petrobras anunciou que o campo seria renomeado de Tupi para “Campo de Lula”. A justificativa oficial seguia a tradição de usar nomes de seres marinhos, mas a coincidência gerou uma enorme controvérsia.
Críticos viram o ato como uma manobra de promoção pessoal com um patrimônio público. A questão foi parar na justiça e, após uma longa batalha legal, um tribunal federal anulou a mudança, alegando “desvio de finalidade”. Em setembro de 2020, a Petrobras comunicou oficialmente que o campo voltaria a se chamar Tupi.
O impacto na economia e os planos de revitalização
O impacto de Tupi na economia brasileira foi transformador. A produção do pré-sal, liderada pelo campo, fez o Brasil passar de importador a uma potência exportadora. Em 2024, o petróleo se tornou o principal produto de exportação do país. Apenas em 2023, o Campo de Tupi gerou R$ 37 bilhões em impostos e royalties.
Hoje, o campo entrou em uma fase de maturidade, e a Petrobras já tem um ambicioso plano de revitalização para estender sua vida produtiva, incluindo novos poços e um possível décimo FPSO. No entanto, o futuro de longo prazo de Tupi depende da resolução de uma complexa disputa com a ANP sobre sua classificação, que impacta impostos e a extensão do contrato. A forma como o Brasil gerenciará este desafio definirá o próximo capítulo da saga de seu campo de petróleo mais importante, um legado que começou com a busca por segurança energética e hoje enfrenta a prova de sua sustentabilidade.
(Publicado em 20/06/2025)